sexta-feira, 30 de abril de 2010

01/05: O Nome da Rosa (Jean-Jacques Annaud, 1986)

O Nome da Rosa - Jean-Jacques Annaud (1986)

Sinopse
Em 1327 William de Baskerville, um monge franciscano, e Adso von Melk, um noviço que o acompanha, chegam a um remoto mosteiro no norte da Itália. William de Baskerville pretende participar de um conclave para decidir se a Igreja deve doar parte de suas riquezas, mas a atenção é desviada por vários assassinatos que acontecem no mosteiro. William de Baskerville começa a investigar o caso, que se mostra bastante intrincando, além dos mais religiosos acreditarem que é obra do Demônio. William de Baskerville não partilha desta opinião, mas antes que ele conclua as investigações Bernardo Gui (F. Murray Abraham), o Grão-Inquisidor, chega no local e está pronto para torturar qualquer suspeito de heresia que tenha cometido assassinatos em nome do Diabo. Considerando que ele não gosta de Baskerville, ele é inclinado a colocá-lo no topo da lista dos que são diabolicamente influenciados. Esta batalha, junto com uma guerra ideológica entre franciscanos e dominicanos, é travada enquanto o motivo dos assassinatos é lentamente solucionado.
Antes da sessão haverá uma pequena palestra ministrada pelo professor Paulo Pizzigatti assim como um debate ao final da sessão também mediado por ele.

Crítica: O Nome da Rosa (Jean-Jacques Annaud, 1986)

Por Rodrigo Carreiro
Extraído de http://www.cinereporter.com.br/dvd/nome-da-rosa-o/


O italiano Umberto Eco sempre foi um semiólogo extremamente respeitado na mundo acadêmico. Apesar disso, jamais teria se tornado conhecido de verdade se não tivesse escrito o romance O Nome da Rosa. Best seller mundial, o livro foi levado ao cinema em 1986, pelo cineasta francês Jean-Jacques Annaud, como um dos mais caros longas-metragens já produzidos na Europa. Seus méritos artísticos são questionáveis, mas ainda assim trata-se de um bom policial.

Imagine se Sherlock Holmes fosse um monge franciscano e vivesse em plena Idade Média. Imaginou? Então você já tem uma boa idéia do que trata O Nome da Rosa. William de Baskerville (Sean Connery) é um veterano religioso que chega a uma abadia isolada, na Itália, em 1327, para investigar uma morte misteriosa ocorrida dentro do monastério. Logo, outras mortes igualmente intrigantes ocorrem no local. As vítimas são sempre encontradas com manchas de tinta nas mãos e a língua preta. As circunstância levam os monges locais a acreditarem que o próprio Diabo esteja por trás dos crimes. É claro que William não acredita nisso nem um pouco.

O personagem de Sean Connery é, claramente, uma brincadeira de Umberto Eco com o lendário detetive inglês de Sir Arthur Conan Doyle. O nome do personagem já o denuncia, pois Baskerville é o título de uma das mais famosas aventuras de Sherlock Holmes. Além disso, William também baseia suas investigações na lógica dedutiva, que exercita sempre em conversas com um pupilo que o chama de “mestre”. Até a semântica do nome do rapaz é uma referência a Sherlock Holmes: Adson, cuja pronúncia fica muito perto de “Watson”. O garoto, interpretado por um Christian Slater adolescente, chega mesmo a ouvir um “elementar, meu caro Adson”, durante as investigações.

Então, o que temos aqui é um thriller de suspense? Sim, em parte. O Nome da Rosa contém todos os elementos que uma caçada a um criminoso desconhecido precisa possuir: personagens enigmáticos, segredos inconfessáveis, túneis e passagens secretas, livros proibidos. Nesse nível simples, O Nome da Rosa funciona que é uma beleza. Mas o filme pretende ser mais do que isso, refletindo sobre o conflito entre religião e ciência (ou seja, a dualidade fé X conhecimento). Esse conflito fica mais do que explícito na figura de William, alguém que se poderia chamar de filósofo religioso, por mais incongruente que seja essa descrição.

Jean-Jacques Annaud faz um bom trabalho na direção. Sua maior virtude talvez tenha sido a excelente escolha do elenco de apoio, uma verdadeira galeria de rostos antológicos: o bibliotecário mau-encarado, o conrcunda desdentado, o intelectual afeminado, a garota misteriosa da aldeia vizinha. Praticamente todos os coadjuvantes parecem ter algo a esconder – e, na maioria das vezes, têm mesmo. Já Sean Connery exibe a segurança habitual, ao lado de um F. Abraham Murray sinistro, na pele de Bernardo Gui, um padre da Inquisição particularmente violento.

Outro destaque do longa-metragem é a coleção de tomadas espetaculares tramadas pelo fotógrafo Tonino Della Colli, colaborador de Fellini e autor dos memoráveis planos dos faroestes de Sergio Leoni. Della Colli conseguiu fazer um filme escuro, cheio de sombras, que ao mesmo tempo é rico em cores e detalhes visuais. A reprodução dos incríveis ambientes medievais – a riqueza da abadia com a miséria da aldeia camponesa – atinge um contraste muito bom, em termos de composição visual.

Essa beleza toda, contudo, parece ter funcionado contra o filme, pelo menos nos EUA. Lá, “O Nome da Rosa” foi um fracasso de bilheteria e crítica. A escuridão das tomadas era motivo de chacota para o público, que não entendeu a função narrativa desse visual: o ambiente de mistério, em que nada é aquilo que aparenta ser, ganha um reforço extraordinário com o visual sombrio do filme. O ritmo lento e reflexivo, bem como a escassez de diálogos, completaram o pacote desfavorável aos norte-americanos. Por outro lado, as platéias européias entenderam o longa, e transformaram em sucesso insesperado por aquelas bandas.

Análise da Obra - O Nome da Rosa

Por Kledson Bruno Camargo
Extraído de
http://www.coladaweb.com/literatura/analise-de-obras/o-nome-da-rosa

Baseado na obra homônima do autor italiano Umberto Eco, o filme O Nome da Rosa conta sobre estranhas mortes começam a ocorrer num mosteiro beneditino localizado na Itália durante a baixa idade média, onde as vítimas aparecem sempre com os dedos e a língua roxos. O mosteiro guarda uma imensa biblioteca, onde poucos monges tem acesso às publicações sacras e profanas. A chegada de um monge franciscano, incumbido de investigar os casos, irá mostrar o verdadeiro motivo dos crimes, resultando na instalação do tribunal da santa inquisição.

INTRODUÇÃO
A Baixa Idade Média (século XI ao XV) é marcada pela desintegração do feudalismo e formação do capitalismo na Europa Ocidental. Ocorrem assim, nesse período, transformações na esfera econômica (crescimento do comércio monetário), social (projeção da burguesia e sua aliança com o rei), política (formação das monarquias nacionais representadas pelos reis absolutistas) e até religiosas, que culminarão com o cisma do ocidente, através do protestantismo iniciado por Martinho Lutero na Alemanha em 1517. Culturalmente, destaca-se o movimento renascentista que surgiu em Florença no século XIV e se propagou pela Itália e Europa, entre os séculos XV e XVI. O renascimento, enquanto movimento cultural, resgatou da antigüidade greco-romana os valores antropocêntricos e racionais, que adaptados ao período, entraram em choque com o teocentrismo e dogmatismo medievais sustentados pela Igreja. No filme, o monge franciscano representa o intelectual renascentista, que com uma postura humanista e racional, consegue desvendar a verdade por trás dos crimes cometidos no mosteiro.

1. Contextualização
Discussão dos elementos formadores da cultura moderna, o surgimento do pensamento moderno, no período da transição da Idade Média para a Modernidade.

O Filme
O Nome da Rosa
pode ser interpretado como tendo um caráter filosófico, quase metafísico, já que nele também se busca a verdade, a explicação, a solução do mistério, a partir de um novo método de investigação. E Guilherme de Bascerville, o frade fransciscano detetive, é também o filósofo, que investiga, examina, interroga, duvida, questiona e, por fim, com seu método empírico e analítico, desvenda o mistério, ainda que para isso seja pago um alto preço.

O Tempo
Trata-se do ano 1327, ou seja, a Alta Idade Média. Lá se retoma o pensamento de Santo Agostinho (354-430), um dos últimos filósofos antigos e o primeiro dos medievais, que fará a mediação da filosofia grega e do pensamento do início do cristianismo com a cultura ocidental que dará origem à filosofia medieval, a partir da interpretação de Platão e o neoplatonismo do cristianismo. As teses de Agostinho nos ajudarão a entender o que se passa na biblioteca secreta do mosteiro em que se situa o filme.

Doutrina Cristã
Neste tratado, Santo Agostinho estabelece precisamente que os cristãos podem e devem tomar da filosofia grega pagã tudo aquilo que for importante e útil para o desenvolvimento da doutrina cristã, desde que seja compatível com a fé (Livro II, B, Cap. 41). Isto vai constituir o critério para a relação entre o cristianismo (teologia e doutrina cristã) e a filosofia e a ciência dos antigos. Por isso é que a biblioteca tem que ser secreta, porque ela inclui obras que não estão devidamente interpretadas no contexto do cristianismo medieval. O acesso à biblioteca é restrito, porque há ali um saber que é ainda estritamente pagão (especialmente os textos de Aristóteles), e que pode ameaçar a doutrina cristã. Como diz ao final Jorge de Burgos, o velho bibliotecário, acerca do texto de Aristóteles – a comédia pode fazer com que as pessoas percam o temor a Deus e, portanto, faz desmoronar todo esse mundo.

2. Disputa de Filosofia
Entre os séculos XII e XIII temos o surgimento da escolástica, que constitui o contexto filosófico-teológico das disputas que se dão na abadia em que se situa O Nome da Rosa. A escolástica significa literalmente "o saber da escola", ou seja, um saber que se estrutura em torno de teses básicas e de um método básico que é compartilhado pelos principais pensadores da época.

2.1 Influência aos Pensamentos
A influência desse saber corresponde ao pensamento de Aristóteles, trazido pelos árabes (mulçumanos), que traduziram muitas de suas obras para o latim. Essas obras continham saberes filosóficos e científicos da Antigüidade que despertariam imediatamente interesses pelas inovações científicas decorrentes.

2.2 Consolidação Política
A consolidação política e econômica do mundo europeu fazia com que houvesse uma maior necessidade de desenvolvimento científico e tecnológico: na arquitetura e construção civil, com o crescimento das cidades e fortificações; nas técnicas empregadas nas manufaturas e atividades artesanais, que começam a se desenvolver; e na medicina e ciências correlatas.

2.3 Pensamento Aristotélico
O saber técnico-científico do mundo europeu era nesta época extremamente restrito e a contribuição dos árabes será fundamental para este desenvolvimento pelos conhecimentos de que dispunham de matemática, de ciências (física, química, astronomia, medicina) e de filosofia. O pensamento agora (Aristotélico) será marcado pelo empirismo e materialismo.

3. A Época
O enredo desenvolve-se na ultima semana de 1327, num monastério da Itália medieval. A morte de sete monges em sete dias e noites, cada um de maneira mais insólita - um deles, num barril de sangue de porco, é o motor responsável pelo desenvolvimento da ação. A obra é atribuída a um suposto monge, que na juventude teria presenciado os acontecimentos. Este filme é uma crônica da vida religiosa no século XIV, e relato surpreendente de movimentos heréticos. Para muitos críticos, o nome da rosa é uma parábola sobre a Itália contemporânea. Para outros, é um exercício monumental sobre a mistificação.

4. O Título
A expressão "O nome da Rosa" foi usada na Idade Média significando o infinito poder das palavras. A rosa subsiste seu nome, apenas; mesmo que não esteja presente e nem sequer exista. A " rosa de então" , centro real desse romance, é a antiga biblioteca de um convento beneditino, na qual estavam guardados, em grande número, códigos preciosos: parte importante da sabedoria grega e latina que os monges conservaram através dos séculos.

5. Blibioteca do Mosteiro
Durante a Idade Média umas das práticas mais comuns nas bibliotecas dos mosteiros eram apagar obras antigas escritas em pergaminhos e sobre elas escreve ou copiar novos textos. Eram os chamados palimpsestos, livretes em que textos científicos e filosóficos ma Antigüidade clássica eram raspados das páginas e substituídos por orações rituais litúrgicos. O nome da rosa é um livro escrito numa linguagem da época, cheio de citações teológicas, muitas delas referidas em latim. É também uma crítica do poder e do esvaziamento dos valores pela demagogia, violências sexuais, os conflitos no seio dos movimentos heréticos, a luta contra a mistificação e o poder. Uma parábola sangrenta patética da história da humanidade Baseado: No romance de mesmo nome de Umberto Eco.

5.1 - Pensamento
O pensamento dominante, que queria continuar dominante, impedia que o conhecimento fosse acessível a quem quer que seja, salvo os escolhidos. No O nome da Rosa, a biblioteca era um labirinto e quem conseguia chegar no final era morto. Só alguns tinham acesso. É uma alegoria do Umberto Eco, que tem a ver com o pensamento dominante da Idade Média, dominado pela igreja. A informação restrita a alguns poucos representava dominação e poder. Era a idade das trevas, em que se deixava na ignorância todos os outros.

6. História
Em 1327 William de Baskerville, um monge franciscano, e Adso von Melk, um noviço que o acompanha, chegam a um remoto mosteiro no norte da Itália. William de Baskerville pretende participar de um conclave para decidir se a Igreja deve doar parte de suas riquezas, mas a atenção é desviada por vários assassinatos que acontecem no mosteiro. William de Baskerville começa a investigar o caso, que se mostra bastante intrincando, além dos mais religiosos acreditarem que é obra do Demônio. William de Baskerville não partilha desta opinião, mas antes que ele conclua as investigações Bernardo Gui, o Grão-Inquisidor, chega no local e está pronto para torturar qualquer suspeito de heresia que tenha cometido assassinatos em nome do Diabo. Considerando que ele não gosta de Baskerville, ele é inclinado a colocá-lo no topo da lista dos que são diabolicamente influenciados. Esta batalha, junto com uma guerra ideológica entre franciscanos e dominicanos, é travada enquanto o motivo dos assassinatos é lentamente solucionado. O ano é 1327. Representantes da Ordem Franciscana e a Delegação Papal se reúnem num monastério Beneditino para uma conferência. Mas a missão deles é subitamente ofuscada por uma série de assassinatos. Utilizando sua brilhante capacidade de dedução, o monge franciscano William de Baskerville, auxiliado pelo seu noviço Adso de Melk, se empenha para desvendar o mistério. Mas antes que William possa completar sua investigação, o monastério é visitado pelo seu antigo desafeto, o Inquisidor Bernardo Gui. O poderoso Inquisidor está determinado a erradicar a heresia através da tortura e se William, o caçador, persistir na sua busca, também se tornará caça. Mas à medida que Bernardo Gui se prepara para acender a fogueira da Inquisição, William e Adso voltam à biblioteca labirintesca e descobrem uma verdade extraordinária.

Resumo
Do ponto de vista do filme que hoje está sendo abordado, notamos que a história passa em um mosteiro na Itália Medieval. A idade média assistiu, em sua agonia um grande debate Filosófico Religioso. Perdido o equilíbrio do tomismo, o homem medieval caiu em dois extremos opostos. De um lado os humanistas racionalistas Frei Guilherme de Ockham, um édito moderno. Tais humanistas cultivaram o antropocentismo julgaram que graças Pa ciências e a técnica, o homem seria capaz de vencer todas as misérias do mundo, até criar uma era de grande prosperidade material e de completa felicidade natural. De outro lado místicos com visão extremamente pessimista da realidade. Para eles o mundo era intrinsecamente mau e irredimível por ser obra de um DEUS perverso, distinto da divindade. Acreditavam que a razão humana era má e só seria desejável perder-se no nada divino. No mosteiro, sete monges morrem estranhamente, isto aborda muito a violência. Há também uma violência sexual, no qual mulheres se vendem aos monges em troca de comida e muitas vezes depois são mortas. Movimentos ecléticos do século XIV, a luta contra a mistificação, o poder, o esvaziamento de valores pela demagogia, são mostrados em um cenário sangrento sobre a política da historia da humanidade.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Programação Maio 2010

Programação Cine Clube Ybitu Katu para Maio de 2010:
ACONTECIMENTOS IMPORTANTES DA HISTÓRIA RETRATADOS NO CINEMA

01/05: O Nome da Rosa (Jean-Jacques Annaud, 1986) - Idade Média
Em 1327 William de Baskerville, um monge franciscano, e Adso von Melk, um noviço que o acompanha, chegam a um remoto mosteiro no norte da Itália. William de Baskerville pretende participar de um conclave para decidir se a Igreja deve doar parte de suas riquezas, mas a atenção é desviada por vários assassinatos que acontecem no mosteiro. William de Baskerville começa a investigar o caso, que se mostra bastante intrincando, além dos mais religiosos acreditarem que é obra do Demônio. William de Baskerville não partilha desta opinião, mas antes que ele conclua as investigações Bernardo Gui (F. Murray Abraham), o Grão-Inquisidor, chega no local e está pronto para torturar qualquer suspeito de heresia que tenha cometido assassinatos em nome do Diabo. Considerando que ele não gosta de Baskerville, ele é inclinado a colocá-lo no topo da lista dos que são diabolicamente influenciados. Esta batalha, junto com uma guerra ideológica entre franciscanos e dominicanos, é travada enquanto o motivo dos assassinatos é lentamente solucionado.
Antes da sessão haverá uma pequena palestra ministrada pelo professor Paulo Pizzigatti assim como um debate ao final da sessão também mediado por ele.

08/05: Tempos Modernos (Charles Chaplin, 1936) - Revolução Industrial
Um operário de uma linha de montagem, que testou uma "máquina revolucionária" para evitar a hora do almoço, é levado à loucura pela "monotonia frenética" do seu trabalho. Após um longo período em um sanatório ele fica curado de sua crise nervosa, mas desempregado. Ele deixa o hospital para começar sua nova vida, mas encontra uma crise generalizada e equivocadamente é preso como um agitador comunista, que liderava uma marcha de operários em protesto. Simultaneamente uma jovem rouba comida para salvar suas irmãs famintas, que ainda são bem garotas. Elas não tem mãe e o pai delas está desempregado, mas o pior ainda está por vir, pois ele é morto em um conflito. A lei vai cuidar das órfãs, mas enquanto as menores são levadas a jovem consegue escapar.
Antes da sessão haverá uma pequena palestra ministrada pela socióloga Fabiane Cancian assim como um debate ao final da sessão também mediado por ela.

15/05: O Sol (Aleksandr Sokurov, 2005) - Segunda Guerra Mundial
Acompanhamos as últimas horas antes da rendição japonesa na Segunda Grande Guerra. O processo de reconhecimento de haver perdido a guerra é mostrado através da magia da câmera de Sokurov, que mostra o interior, ou melhor, torna o interior abstrato em coisa. Que pode ser vista, sentida, tornando-se quase algo tátil.
Antes da sessão haverá uma pequena palestra ministrada pelo professor Carlos Alexandre Fernandes assim como um debate ao final da sessão também mediado por ele.

22/05: Estado de Sítio (Costa-Gavras, 1972) - Golpes Militares na América Latina
Em uma ousada operação tática, o grupo guerrilheiro Tupamaro seqüestra o cônsul brasileiro no Uruguai e o cidadão norte-americano Philip Michael Santore (Yves Montand), funcionário de uma agência americana. Com o sucesso da operação, os Tupamaros partem para a segunda faze do plano: negociações exigindo a troca dos seqüestrados por militantes presos. O incidente causa grande repercussão internacional e diplomática, deixando o governo em xeque e o presidente uruguaio próximo da renúncia. Enquanto isso, o líder do grupo foca as atenções no interrogatório do americano Santore, a quem atribui a responsabilidade direta na seleção e treinamento de vários policiais militares em tortura, antenados e na articulação do Esquadrão da Morte. Um filme surpreendente e esclarecedor do mestre do cinema político Costa-Gavras que desvenda de forma brilhante vários fatos da nossa história recente.
Antes da sessão haverá uma pequena palestra ministrada pelo historiador João Carlos Figueroa assim como um debate ao final da sessão também mediado por ele.

29/05: Paradise Now (Hany Abu-Assad, 2005) - A Questão Palestina
Amigos de infância, os palestinos Khaled e Said são recrutados para realizar um atentado suicida em Tel Aviv. Depois de passar com suas famílias o que teoricamente seria a última noite de suas vidas, sem poder revelar a sua missão, eles são levados à fronteira. A operação não ocorre como o planejado e eles acabam se separando. Distantes um do outro, com bombas escondidas em seus corpos, Khaled e Said devem enfrentar seus destinos e defender suas convicções.
Antes da sessão haverá uma pequena palestra ministrada pelo professor Alexandre Camilo Magalhães assim como um debate ao final da sessão também mediado por ele.

Cartaz Programação Maio 2010

sexta-feira, 23 de abril de 2010

24/04: O Anjo Exterminador (Luis Buñuel, 1962)


Sinopse:
O Anjo Exterminador é uma das grandes obras-primas do mestre do surrealismo Luis Buñuel (1900-1983). O ponto de partida do roteiro é dos mais originais da história do cinema. Depois de festa de gala, os ricos convidados, por uma razão inexplicável, não conseguem deixar o local. Conforme os dias, as horas e as semanas se passam, a situação piora. As máscaras e convenções sociais começam a ruir, revelando a falsidade e podridão de cada pessoa. Duração: 95 minutos.

Crítica: O Anjo Exterminador (Luis Buñuel, 1962)

(Publicado originalmente em: http://www.kollision.biz/movies/mov_files/mov_angelexterminador.htm)

O Anjo Exterminador é tido por muitos como uma das obras-primas de Luis Buñuel e uma das obras surrealistas máximas de toda a história do cinema. Como tal, causa uma expectativa danada para quem o vê pela primeira vez, e com certeza deixa uma impressão marcante na audiência, seja ela boa ou ruim (a impressão, não a audiência).

O início do filme parece-se muito com uma obra de Robert Altman. Uma profusão de personagens no que parece ser um simples jantar de gala oferecido por um rico aristocrata aos seus convidados. No entanto, à medida que as cenas se sucedem, percebe-se algo estranho. Nenhum dos convidados vai para casa, passando a noite na sala de forma nada convencional para membros da alta sociedade. Mais a seguir todos percebem que, de forma inexplicável, ninguém parece ser capaz de sair da casa. Trancados naquele espaço ínfimo, todos têm que lidar com seus medos e interagir com os outros num ambiente de implacável tensão e isolamento.

A carga crítica contra os costumes da burguesia contida neste filme é impressionante. Quando as máscaras e as convenções começam a cair por terra, é interessante observar a degradação daqueles que se colocam acima de toda a sociedade e a sua reação diante das dificuldades encontradas. Mesmo a audiência se acostuma, depois de algum tempo de filme, ao fato de que eles não sairão da casa, e esquece o porquê daquilo estar acontecendo. A pergunta que inicialmente é feita (por que diabos isso está acontecendo?) estabelece um mistério inicial que depois dá lugar à angústia que perdura até o final. E, em se tratando de uma obra abertamente surrealista, não há garantia alguma de que este mistério terá uma "solução", digamos, transparente.

Alfinetadas sutis e quase imperceptíveis sobre adultério, incesto e homossexualidade são insinuadas no decorrer do filme. Além disso, várias questões são levantadas. Sobre quem deveria ou não estar preso na casa e sobre aqueles que sentiram uma vontade incontrolável de sair antes do fim do jantar, por exemplo. Por quê? O que estaria por trás de tudo? Independente de como cada um interpretará o desfecho, O Anjo Exterminador é um filme original e marcante, mas decididamente não indicado à platéia ávida por filmes pipoca.

domingo, 11 de abril de 2010

17/04: Los Bastardos (Amat Escalante, 2008)

Los Bastardos - Amat Escalante (2008)

Sinopse
Num período de 24 horas, o filme descreve a vida de Fausto e Jesus, dois trabalhadores mexicanos em Los Angeles. Como em todos os dias, eles sofrem grande pressão no trabalho. Mas diferente de todos os outros dias, dessa vez Jesus carrega uma espingarda na mochila. Destaque da mostra Un certain regard em Cannes no ano de 2008. Duração: 86 minutos

Crítica: Los Bastardos (Amat Escalante, 2008)

publicado originalmente em inglês por Joey Munõz em http://www.imdb.com/title/tt0841922/usercomments

Los bastardos é um filme sobre dois solitários imigrantes mexicanos em Los Angeles, que são forçados a passar uma noite com uma também solitária mulher americana, sob circunstâncias extremas. Esses dois imigrantes são Jesús e Franco. Quando se ouve o primeiro tiro, Fausto, o mais novo, deixa para trás a bola que estava brincado, deixando para trás a sua inocência, para ser contratado, ao lado de Jesús, para matar alguém. O enredo faz as pessoas pensarem que o filme é um thriller de ritmo intenso ou algo como um calvário em Funny Games (Michael Haneke, 1997). Mas não, esta película é como um filme do também mexicano Carlos Reygadas: há a ação mas não há uma reação; há a contemplação do momento. Isso dá ao expectador tempo para refletir e deixar os sentimentos se aprofundarem; particularmente sobre o estilo de vida dos trabalhadores mexicanos nos Estados Unidos, que é algo bastante triste de se assistir.

A história do filme é levada em um ritmo muito lento e cada tomada leva a algo que era inesperado. O uso de não-atores e uma belíssima fotografia da cidade de Los Angeles tornam as situações vividas no filme extremamente autênticas. Sim, é um filme deliberadamente lento, que usa esse ritmo para construir sentimentos, para então destruí-los no final. Um filme muito bem dirigido onde a linguagem da câmera fala para a platéia. Ao final, pensei que esse filme era mesmo o que eu precisava assitir na época e que eu poderia vê-lo novamente para analisar sua belíssima fotografia e seu ritmo fascinante. Este filme é um tipo bastante peculiar de cinema, extremamente bem realizado, que se não consegue ser alçado à categoria de obra prima é porque não estamos acostumados com um filme tão determinado a ser profundo.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

10/04: A Montanha Sagrada (Alejandro Jodorowsky, 1973)

Sinopse
Jodorowsky interpreta o papel do "alquimista" que reúne um grupo de pessoas que representam os planetas do Sistema Solar. Sua intenção é submeter o grupo a uma série de ritos de natureza mística para que se desprendam da bagagem "mundana" antes de embarcar numa viagem em direção à misteriosa Ilha de Loto. Uma vez na insula, iniciam a ascensão à Montanha Sagrada para substituir os Deuses imortais que em segredo dominam o mundo. Ninguém havia visto nada igual até a data de lançamento deste filme. Foi a grande obra ovacionada no Festival de Cannes em 1973. Duração: 114 minutos

APÓS A SESSÃO, HAVERÁ UM PEQUENO DEBATE MEDIADO POR CARLOS FERNANDES E DANIEL MORAES.

Crítica - A Montanha Sagrada (Alejandro Jodorowsky, 1973)

por Geuzebio
Extraído de http://www.cineplayers.com/critica.php?id=1177

Diretor de cinema e teatro, ator, produtor, compositor, escritor, autor teatral, filósofo, humorista, especialista em tarot, um dos criadores do “Teatro do Pânico” e do conceito de “Midnight Movies”, espiritualista e mestre dos quadrinhos. Essas são as "qualificações" de Alejandro Jodorowsky, cuja obra cinematográfica, apesar de não tão vasta, é considerada ainda hoje como uma das mais instigantes e experimentais, fazendo coro com cineastas como John Walters e David Lynch.

Dizem que o vovô do cineasta foi um judeu russo que trocou a Ucrânia pelo Chile, e atravessou os Andes acompanhado de uma mula e de sua Torá. Se isso assim o foi, teria sido possível a Jodorowsky escapar a uma predileção natural pela força do simbolismo? Principalmente o simbolismo mítico, numa mistura de fontes, entre cristãs, judaicas e pagãs; entre heranças e uma realidade lingüística e cultural diferente.

Assim, recebemos em forma de filmes a conjunção destas referências, a busca incessante pela revelação de uma supra-realidade: o que Jodorowsky quer é desafiar o homem comum a experimentar sensações às quais ele normalmente não se permite, partindo assim a um novo estágio, onde o homem entenderá melhor a sua própria natureza, sem as prisões dogmáticas às quais está acostumado a acomodar-se.

Essa é a natureza de A Montanha Sagrada. Esse foi meu primeiro contato com a obra de Ojodoro, aproveitando uma mostra promovida pelo CCBB que em sua fase carioca encerra-se neste final de semana. Apesar de já ter lido alguns artigos e críticas a respeito do autor - que oscilam entre considerá-lo gênio ou um contestador nonsense - desenvolver uma opinião escrita a respeito da experiência única de assistir a um filme seu, ainda mais em tela grande, pareceu um desafio tão interessante quanto necessário.

O cinema de Jodorowsky se mostrou complexo desde seu início: seu segundo filme, El Topo, foi gravado no México e com recursos próprios. Buscando a entrada no mercado norte-americano de cinema, ele tentou em vão vender os direitos deste filme. O problema é que em 1970 esta película não possuía par e os produtores não sabiam como vendê-la. Chegando então nas mãos de um antigo produtor que possuía uma sala de cinema em Nova York, o Cine Elgin, foi feita a proposta de exibirem El Topo nas sessões de meia-noite. Algumas semanas depois a sala não só estava lotada, como filas dobravam a esquina. A partir de então a maioria dos filmes considerados "inclassificáveis" passaram a ser denominados Midnight Movies, exibidos nesse horário não-comercial e criando uma série de fiéis seguidores do gênero. Essa é uma façanha importante sem a qual muitos absurdos maravilhosos do cinema talvez não existissem, vide a importância de um Lynch nos dias de hoje.

Voltemos à Montanha Sagrada...

Numa grande alegoria, com cenas e cortes que vez por outra não se conectam por uma lógica narrativa comum, a ação começa com Jodorowsky – guru numa espécie de rito iniciático, para em seguida sermos apresentados a um homem a quem chamam Ladrão cuja figura lembra a de Jesus Cristo. Ladrão vaga pelas ruas do México quando é crucificado e apedrejado por um grupo de crianças. Nesse momento ele inicia uma verdadeira amizade com um anão que será um dos poucos a acompanhá-lo em sua saga. Partindo para a cidade eles são testemunhas de várias situações, como um episódio em que soldados massacram alguns cidadãos comuns enquanto alguns estão às voltas com prostitutas de todos os tipos, cores e tamanhos. Felizes e sorridentes, um casal de turistas fotografa tudo com grande curiosidade. O tom de crítica é explícito!

Depois de algumas voltas, Ladrão é "sequestrado" por uns tipos que se assemelham a autoridades religiosas, que o carregam e preparam, fazendo dele o molde para várias estátuas de um homem crucificado. Ao acordar e se deparar com várias cópias de si mesmo, Ladrão tem um surto e no meio dele é acolhido pela prostituta-com-um-chipanzé, uma caricatura de Maria Madalena, que a partir daí será sua seguidora fiel.

Ainda vagando, ele encontra uma torre enorme que se ergue até o céu, e resolve escalar para encontrar uma resposta. No topo da torre ele encontra Jodorowsky-Alquimista que resolve prepará-lo e iniciá-lo num grupo de escolhidos que terão acesso a uma aventura em busca da montanha sagrada, na qual terão acesso ao segredo maior da existência. Dentro da torre tudo é simbólico: elementos alquímicos, pops, o yin e o yang, cartas de tarot e o cocô como elemento de expurgo e transformação interior. Tudo são artifícios cabíveis na alegoria de Ojodoro. Os outros escolhidos são também um capítulo à parte, com referências ao absurdo da industrialização e do consumo, da ganância e do materialismo dominantes na sociedade, esses escolhidos se fazem escolher justamente por seus deméritos e ganâncias.

Montado o grupo, eles partem para a viagem final à montanha sagrada. Pelo caminho, provações e tentações os aguardam e mais e mais alegorias se apresentam e se acumulam, até o final metafílmico que está ali justamente para colocar o espectador consciente da ilusão ficcional, jogando com o próprio engendramento da realidade a qual muitos enxergam sob o signo da ficção.

Merece destaque a cena em que Ladrão tenta multiplicar os pães para saciar a fome de um grupo de crianças, ao que é advertido por Jodorowsky – guru, que lhe mostra a pequena guerra em que se transformaria o acúmulo dos pães multiplicados. Sarcástico, escatológico, filosófico e mimético são alguns dos adjetivos possíveis de A Montanha Sagrada. Definitivamente, um clássico que deve ser assistido.

por Eduardo Valente
Extraído de http://www.revistacinetica.com.br/holymountain.htm

Antes de entrar no Espaço Unibanco quase às 0h desta terça-feira, eu só conhecia o cinema de Alejandro Jodorowsky de relatos de amigos. Por eles, tinha alguma expectativa, mas confesso que também um certo grau de ceticismo, já que muitas vezes (especialmente com filmes da década de 1970) os anos são cruéis com alguns filmes e cineastas adorados por vários conhecidos, e que acabam não me dizendo muito. Pois, lá pelo meio da primeira seqüência de The Holy Mountain (título que, sabe-se lá por qual motivo, o Festival do Rio resolveu “traduzir” para espanhol na sua programação), qualquer resquício de descrença já tinha abandonado meu corpo: o cinema de Jodorowsky é de verdade.

Descrença e verdade são duas palavras curiosas para se referir a este filme em especial, visto que religião e misticismo estão mais do que no centro de suas atenções. Ao longo do filme, Jodorowsky realiza um cinema curiosamente profano e religioso ao mesmo tempo. Lendo entrevistas dele, depois, pude entender alguns dos motivos para esta sensação que tive, pela maneira como ele fala com enorme interesse e admiração, por exemplo, pela figura e os ideais de Cristo, mas sem grande valor pelo seu uso pelo catolicismo institucionalizado.

Foi da mesma entrevista que eu tirei a frase que me serviria como chave para dar conta da minha reação ao filme: “a agressão é afetividade”, diz Jodorowsky. E isso resume bem a sensação que tive ao final da projeção: no meio de um cinema extremamente crítico, às beiras do cinismo muitas vezes, e com inegável intenção de causar reação na platéia, as entrelinhas deixam ver um olhar para o mundo surpreendentemente afetuoso. Isso fica claro especialmente no final do filme, quando vemos que toda sua estranha odisséia termina com um inesperado chamamento ao amor e à vida. No entanto, este chamamento vem embrulhado num coquetel altamente explosivo, que mistura sem medo o humor e o horror com incrível simultaneidade (alas, as três palavras-chave do movimento Pânico, do qual ele é um dos fundadores).

Se é bem sabido que Jodorowsky é uma figura e tanto, sendo não só cineasta, como escritor, dramaturgo e quadrinista – e, talvez acima de tudo, “bruxo” (as aspas vão pelos diferentes entendimentos da palavra), meu maior choque com o seu cinema, através deste filme, foi mesmo pela sua capacidade audiovisual, seu olho incrivelmente apurado que consegue algumas das composições e movimentos de câmera mais impressionantes que vi em algum tempo. Entre as claras influências de Buñuel, e o diálogo com uma série de artistas plásticos e dramaturgos do seu tempo, Jodorwsky tem uma voz e pegada próprias. Algumas de suas imagens, esfuziantes e horríveis ao mesmo tempo, são difíceis de apagar da memória. O homem que sobe a torre, a sala com as cores do arco íris, o “Bar Pantheon”, as numerosas estátuas, as putas na Igreja... Difícil enumerar todas elas.

Não sem alguma razão, alguns amigos revelaram revolta com o uso que o filme faz de animais – embora eu ache que na maior parte das vezes o quase sufocante excesso de bichos na tela mostra uma visão quase idealizada destes. Mas, de fato, especialmente na seqüência com os sapos e camaleões pode-se dizer que Jodorowsky excede os limites – mas, talvez o que ele queira justamente é questionar estes limites. E, embora eu não tenha a menor vontade de reproduzir uma experiência semelhante, é inegável a força que ela produz na tela, sendo justamente esta uma das grandes seqüências do filme.

Fato é que o cinema de Jodorowsky em The Holy Mountain é uma experiência única – e isso está cada vez mais difícil de se dizer de algum filme. Principalmente por isso, no meio de um festival de cinema é programa obrigatório.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Entrevista de Alejandro Jodorowsky publicada na revista Contracampo

Extraído de http://www.contracampo.com.br/90/artjodoentrevista.htm

A chegada no antro de Jodorowsky já é um rito iniciático em si, implicando o uso de um elevador antigo que funciona apenas quando as suas quatro portas estão fechadas. No entanto, ele acaba por nos conduzir ao apartamento de um dos mais singulares criadores: cineasta, roteirista de HQs, mímico, poeta apaixonado por esoterismo e tarô. Alejandro Jodorowsky é um autêntico versátil. Ele nos recebe calorosamente em seu apartamento, vestindo uma camisa com a estampa de El Topo, por ocasião do tão esperado lançamento de seus filmes em DVD. O tempo para pedir que um dos numerosos gatos que povoam o lugar ceda um pouco de espaço para se sentar e a conversa começa.

Várias gerações de cinéfilos descobriram seus filmes graças a projeções mais ou menos clandestinas ou a cópias piratas de qualidade duvidosa. Hoje, três de seus principais filmes se encontram disponíveis em todo lugar. Como você se sente?

Eu estou contente, e o que me deixa mais feliz é que eu tive a oportunidade de trabalhar com cópias perfeitas e eu mesmo me ocupei da remasterização. Eu esperei demais por esse momento para não estar eufórico. É realmente algo tão forte que eu não posso dizer o que eu sinto exatamente. Enfim, é possível ver os filmes tais como eles são. Portanto, eu estou feliz enquanto artista, mas isso não infla o meu ego. Tive que receber muitos golpes por isso. Às vezes, eu gostaria de ser odiosamente egocêntrico, mas não chego a isso.

Por outro lado, antigamente, era necessário buscar os seus filmes se se quisesse vê-los. Hoje, você os encontra em todos os lugares. Não se tem a impressão de perder um pouco o seu status de cineasta “cult”?

Eu vou te dizer: o produtor Allen Klein me declarou guerra, e talvez ele tivesse razão. El Topo e A Montanha Sagrada o fizeram lucrar muito nos Estados Unidos. Em seguida, ele quis que eu adaptasse História d’O e eu queria fazer Duna. Na hora de assinar o contrato, eu bati a porta na cara dele e fugi. E, então, ele decidiu que ninguém mais no mundo iria ver os meus filmes. Ele destruiu as cópias que tinha à sua disposição, mas felizmente eu tinha conservado cópias em vídeo. E, então, eu iniciei uma verdadeira guerrilha: aonde eu fosse, eu distribuía as cópias, gratuitamente. Então, as pessoas puderam ver os filmes em circuito underground. Era a minha guerra e hoje, eu a ganhei.

Como se resolveu o seu desentendimento com Allen Klein? Eu acho que vocês chegaram a ir à justiça.

Sim, eu desafiei o monstro. Ele é muito poderoso: ganhou processos contra os Rolling Stones, os Beatles, Phil Spector, enfim, os maiores e os mais ricos. Eu sabia em que laboratório mexicano encontrar os negativos. Então, eu entrei em contato com alguém na Inglaterra e disse: "Eu te dou os negativos e você os lança em vídeo. Allen Klein tomará conhecimento disso e irá processá-lo. Você o dirá que a idéia foi minha, eu assumirei toda a responsabilidade". E foi assim que se chegou ao processo. Eu fui assessorado pelo Dr. Bitoun, um formidável advogado francês remunerado por porcentagem enquanto Klein pagava seus advogados a $500 por hora. Ao cabo de dois anos de processo, eu fui me encontrar com Roddt, o filho de Klein. Eu lhe disse que eu poderia continuar por dez anos, mas que eles perderiam uma fortuna por dia. Ele não poderia conduzir o seu pai a buscar um acordo amigável? Por que eu lhe fiz essa proposta? Eu tinha me dado conta de que eu havia vivido muito, criado muito, e que eu não poderia odiar uma pessoa por toda a minha vida. Afinal de contas, para mim seria igual se os filmes desaparecessem, tudo isso já tinha passado. Então, decidiu-se fazer um encontro em Londres. Eu iria rever uma pessoa que eu odiava há trinta anos, e quando ele abriu a porta, me deparei com um senhor de cabelos brancos, como eu. Ele me olhou e me disse: "Você está bonito!" Eu lhe respondi: "Você se parece a um velho mestre espiritual!" E nos abraçamos. E, em três, quatro minutos, voltamos a ser amigos. Apesar de tudo, ele sempre me admirou e foi graças a ele que pude realizar os meus filmes. E assim, nós entramos em um acordo.

Você mesmo supervisionou a remasterização dos filmes?

Sim, eu me ocupei de tudo. Os Klein investiram $500.000 na restauração, e me deram uma equipe completa. Eu cheguei a passar até dez horas, sem parar, sobre as máquinas com um técnico que mudava tudo o que eu queria. Por exemplo, em El Topo, há uma cena na qual as prostitutas estão reunidas na igreja, e entre elas, se encontrava um macaco, que não se via muito bem. Eu pedi ao técnico que o iluminasse um pouco mais, e em três cliques, a luz estava sobre ele. Para mim, é formidável, é melhor que uma ejaculação! (risos) Enfim, eu tenho a possibilidade de corrigir todos os erros feitos durante a filmagem. 1

Você disse que seria igual se os seus filmes desaparecessem. Entretanto, durante muito tempo, acreditou-se que Fando e Lis, o seu primeiro longa-metragem, tinha se perdido. Isso realmente lhe deixa totalmente indiferente?

Eu montei centenas de peças no México; e ao fim de cada representação, não resta mais nada, o teatro é como a fumaça. Então, eu me habituei ao fato de que as obras de arte se perdem. No momento em que o meu primeiro curta, A Gravata se perdeu; bom, ele se perdeu. 2 Não se podia mostrar El Topo e A Montanha Sagrada? Não era grave; eu continuei a viver, a fazer outra coisa. Eu jamais deixei de criar, isso me permitiu suportar tudo isso. Olhe Dan O’Bannon, por exemplo: ele trabalhava no meu projeto Duna, e devia se ocupar dos efeitos especiais. Após o abandono do filme, ele fez uma terapia, por dois anos, esteve quase louco. Ele saiu dessa situação e em seguida escreveu o script de Alien. Mas, o choque o conduziu a viver fora do mundo durante dois anos. Eu não. Eu simplesmente mudei de caminho, e com Moebius, passamos aos HQs e fizemos O Incal. Assim, eu resisti.

Justamente, você se exprimiu em numerosos domínios artísticos diferentes, da mímica aos HQs: qual é a sua abordagem do cinema enquanto mídia específica? O que ele lhe permitiu fazer ou não fazer?

Cada arte tem o seu domínio de expressão próprio; então não é que ele permite fazer o que não se pode fazer em outro lugar. Quando eu faço cinema, é apaixonante; mas quando escrevo um poema, também é inteiramente apaixonante. São meios de expressão diferentes, com temáticas diferentes.

Mas, você se sente mais livre em certos domínios, como nos HQs? Quando você escreve O Incal, você tem menos constrangimentos?

Não, o domínio mais livre é a poesia. Pois aí, você está totalmente sozinho. O que também é válido para o romance. Já nas HQs é diferente, você deve dialogar com um desenhista. No cinema é muito mais difícil. É uma guerra, e se você quiser impor a sua visão, você pode deixar aí a sua saúde, a sua vida. Todo mundo tem a sua idéia do filme, e aí você negocia com comerciantes, políticos. É verdadeiramente difícil.

Você se lamenta de algo? Das idéias não realizadas? Evidentemente, se pensa em Duna.

Eu não tenho lamentos. Meus filmes não são certamente o que eu quis fazer, mas o que eu pude fazer. O máximo do que eu pude realizar. As coisas seriam diferentes se eu tivesse $100.000.000, mas eu jamais os terei. Então, eu me contentei em fazer o que pude.

Em Constelação Jodorowsky, Moebius faz um comentário interessante: "era a preparação de Duna o que era importante, o sonhar, buscar as idéias. Mas, o fato de não ter sido filmado não é muito grave."

É verdade, mas o filme, ele existe, ele está lá (aponta a coletânea de storyboards sobre uma estante). Você fala de lamentos. Mas, eu posso te dizer: eu tenho quatro filhos. Um deles morreu. Não existe nada mais terrível do que enterrar um filho. Porém, se faz o luto, não se pode ficar bloqueado, é preciso continuar a viver. Duna é como a morte de um filho. É um choque. É fazendo outra coisa que se sobrevive a isso.

Voltando ao seu primeiro longa-metragem, Fando e Lis, parece que a sua recepção foi difícil, sobretudo quando o exibiram no Festival de Acapulco.

Na época, o México produzia apenas um cinema muito popular; histórias de amor cor-de-rosa, sem nenhuma preocupação metafísica. Quando exibiram Fando e Lis, filme totalmente realizado fora da estrutura estabelecida, isso provocou um efeito de bomba, o tomaram como um insulto. Tentaram me linchar, e eu tive que abandonar o cinema escondido no fundo de um carro, após terem desligado as luzes para que eu pudesse escapar no escuro. Para eles, eu tinha violado o cinema mexicano.

Por causa das imagens utilizadas, dos temas abordados, ou por não ter respeitado as convenções de produção?

Eu penso que é um todo. Claro que para os sindicatos era um escândalo político. Mas as imagens também precipitaram isso. Uma moça que dorme com um porco, não é possível! O mesmo para um personagem que bebe sangue de verdade, me acusaram de ser um vampiro! E mais, eu tive má sorte: somente puderam exibir o filme um ano depois de tê-lo acabado, e durante todo esse tempo, a atriz seguiu um regime draconiano. Em Fando e Lis, ela estava muito bonita; chegando ao festival, ela tinha o ar de ter saído de um campo de concentração: os críticos declararam, então, que eu tinha sugado o seu sangue, que eu quase a tinha matado. E mais, Sergio Kleiner 3 confirmou todas as acusações de torturas.

Vê-se que não se estava nas condições ideais para filmar, mas o que o levou a passar da pantomima ao cinema?

Eu sempre quis fazer um filme, mas não antes de constituir primeiro o meu universo pessoal. Os espetáculos me ajudaram a criar o meu próprio estilo, alguma coisa que não devia a nenhum cineasta, enfim o estilo “jodorowskiano”. Quando eu me senti pronto, eu me lancei.

Você diria que os seus filmes se endereçam ao espírito ou aos sentidos? A compreensão, mesmo parcial, lhe parece indispensável?

Fando e Lis, El Topo e A Montanha Sagrada são filmes para o espírito, muito claramente. Enquanto que Santa Sangre busca suscitar a emoção, é verdadeiramente uma outra via que eu tomei. Alguns o preferem, pois os toca muito mais. Mas, para mim, são obras da mesma qualidade. No que concerne à compreensão, Ben Cobb, um excelente escritor, lançou um livro sobre mim na Inglaterra: é lendo o que ele escreveu sobre El Topo que eu verdadeiramente compreendi o filme, ele o explica bem melhor do que eu, pois eu jamais o compreendi intelectualmente. Meus filmes não se endereçam ao intelecto. Mas, eu recomendo ver A Montanha Sagrada escutando o comentário, no áudio. Aí eu explico os símbolos, e são dicas que podem ser interessantes. Não necessárias, mas divertidas.

Seus projetos não são fáceis de realizar. Hoje ainda é possível encontrar produtores com vontade de realizar um filme de Jodorowsky?

Eu jamais encontrei um produtor que tivesse vontade de fazer um Jodorowsky, mas eu sempre encontrei alguém para fazê-lo. Agora mesmo, buscamos alguém para realizar Bouncer, adaptação do meu HQ. Robert Taicher, que já tinha trabalhado em A Montanha Sagrada, tenta reunir cinco milhões de dólares para realizar King Shot. E um outro produtor busca atualmente doze milhões para fazer Os Filhos de El Topo. Mas, eles nunca os encontram, nem nos bancos ou nas redes de televisão. Eis porque eu dou entrevistas por ocasião do lançamento de meus filmes; se mostrar o quanto é rentável, talvez encontraremos investidores, prontos para começar um pequeno filme de cinco milhões. A pré-produção de King Shot já está terminada; se alguém me der cinco milhões após ter lido a sua entrevista, eu começo em seguida! Do mesmo modo, eu gostaria de remontar Tusk ou O Ladrão do Arco-Íris, mas isso exigiria um investimento de $ 200.000.

A sua experiência com O Ladrão do Arco-Íris esfriou a idéia de voltar a trabalhar um dia em um grande estúdio?

Ah, não, isso nunca mais! Marilyn Manson quer trabalhar comigo, eu digo sim! Santiago Segura, um grande ator espanhol, quer trabalhar comigo, eu digo sim! Compreende-se. Mas, eu não quero nunca mais ter que trabalhar com alguém como Peter O’Toole. Ele chega no platô como se fosse o mestre do mundo, e começa a ficar louco de raiva com o propósito de mostrar que é ele quem tem poder, tudo isso porque ele exige um primeiro plano que eu não tenho vontade de fazer... mas, que se dane!

Você pode nos dizer alguma coisa mais sobre King Shot?

É difícil... um casal de jovens, arquitetos, vão para um cassino, no meio do deserto: eles são detidos pelo exército, após a descoberta de membros gigantes. Eu não posso te dizer mais, o próprio de meus filmes é que eles não podem ser contados, eu devo somente fazê-los.

Você tem um olhar um pouco desiludido sobre o cinema de hoje, você ainda vê filmes que te apaixonam, te seduzem?

Que me apaixonam, não, mas alguns me divertem, ao menos eu encontro freqüentemente um pedaço interessante. Por exemplo, O Festim Chinês, de Tsui Hark: eu não adoro o filme, mas a seqüência do concurso, onde uma das personagens cozinha uma pata de urso, é para mim genial. Em Old Boy, há um combate em um corredor que se assemelha a um baixo-relevo egípcio: genial! Em A Ilha, um personagem tenta se suicidar engolindo um anzol, também é formidável. Um cineasta incrível é Takashi Miike: ele faz sei lá o quê, filmes muito ruins. Mas, em cada um deles, você encontra uma cena incrível. Em A Big Bang Juvenil, durante uma seqüência na prisão, um homem tenta estrangular um outro com um cordão, mas não consegue, a moral o impede. O outro quer morrer, lhe toma as mãos e se estrangula a si mesmo, em um instante se torna um suicídio. Eu me pergunto como podem inventar isso, eu acho formidável introduzir noções homossexuais de modo tão sutil. Outro exemplo, em Fudoh, uma moça lança dardos envenenados graças a um tubo enfiado em sua vagina, a uma das vítimas que recebe sangue no rosto, ela replica: "Me desculpe, eu estou menstruada". É incrível. O mesmo para Taxidermia, você vê um homem que se masturba e uma chama sai de seu sexo: são imagens que ficam. Todos os dias, eu encontro imagens que me agradam. Talvez um dia eu poderei pegar uma tesoura e fazer a minha própria compilação.

Entrevista concedida a Franck Suzanne, no dia 25 de abril de 2007.

(Publicada originalmente em Dvd Classik.com.
Acesso em 22 de dezembro de 2007. Traduzido do francês por Fabián Núñez.)

1. Mais tarde, eu soube que a mudança que o deixa mais orgulhoso foi a de ter podido modificar as cores das formigas de A Montanha Sagrada. (N.A.)

2. O curta-metragem A Cravata (La Cravate), realizado na França em 1957 e considerado perdido, foi recentemente encontrado na Alemanha. Foi exibido no Brasil, por ocasião da Mostra Jodorowsky, no CCBB do Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília, em 2007. (N.T.)

3. O ator do filme que interpreta Fando. (N.T.)

Biografia: Alejandro Jodorowsky


"A maior parte dos cineastas fazem filmes com os olhos. Eu faço filmes com os colhões. (...) Exijo dos meus filmes o mesmo que os norte-americanos exigem das drogas psicodélicas."

Esta é com certeza uma das mais célebres frases do diretor, dramaturgo e quadrinista Alejandro Jodorowsky, conhecido por seu cinema transgressor, pouco preocupado em agradar ao grande público e que mistura símbolos místicos de várias culturas com imagens surrealistas. E, por mais extravagante que possa ser, ela é extremamente coerente com sua obra.

Alejandro Jodorowsky nasceu em Iquique, no Chile em 07 de fevereiro de 1929, mudando-se para Santiago em 1942, ao ingressar na universidade para estudar psicologia. Formado, muda-se em 1955 para Paris onde estudou mímica com Marcel Marceau. Nessa époica conhece Maurice Chevallier e com ele faz seu primeiro filme A Gravata (1957) que por muito tempo permaneceu desaparecido. Nessa mesma época conhece o dramaturgo espanhol Fernando Arrábal e o pintor francês Fernando Arrabal. Os três juntos fundariam em 1962 o Moviment Panique, uma corrente de pensamento e expressão artística concebida em homenagem ao deus grego Pan. Era um grupo multímidia onde as performances eram sempre ao vivo e misturavam teatro de vanguarda, literatura e cinema. Nessa mesma época cria uma tira de história em quadrinhos Fabulas panicas e publica diversos livros e dirige diversas peças teatrais vanguardistas em Paris e na Cidade do México.

É no México que Jodorowsky faria a sua estréia como diretor de cinema com o filme Fando e Lis (1967), baseado em uma peça de Fernando Arrábal que juntos haviam dirigido anos antes. O filme estreou no Acapulco Film Festival e sua primeira exibição causou um grande tumulto. Fando e Lis com sua história de um jovem de vinte anos e sua amiga paralítica, infantis e abandonados, em busca de uma cidade chamada Tar, chocou a platéia mexicana de tal modo que Jodorowsky, sob ameaça de violência, teve de sair da sala fugido pelas portas dos fundos e disfarçado e o filme foi banido no México.

Apesar dessa "efusiva" recepção, Jodorowsky permaneceu em seu estilo inconfunível e marca o seu nome no cinema com duas obras primas nos anos 70. Em 1971 lança El topo, um faroeste surrealista onde um pistoleiro na busca de capturar os responsáveis por um massacre, acaba por realizar uma viagem espiritual em busca da transcendência. El topo estrou sem alarde nos EUA em dezembro de 1970, numa sessão programada para a uma da madrugada no teatro The Elgin. Entretanto, El topo provocava fascinação em muitos dos que o assistiam e a propaganda boca-a-boca fez com que o filme conseguisse uma expressiva bilheteria e projetasse o nome de Jodorowsky no cinema mundial. O ex-beatle John Lennon e sua esposa Yoko Ono impressionados com o filme propõem a Jodorowsky o financiamento de um de seus filmes. Como resultado, chegaria aos cinemas, dois anos depois, A Montanha Sagrada (1973), a obra prima de Jodorowsky que foi ovacionada no Festival de Cannes no mesmo ano.

Agora famoso, Jodorowsky retorna à França em 1975 com o obejtivo de fazer uma versão para o cinema do romance Duna de Frank Hebert. O filme teria a participação no elenco de Orson Welles e Salavador Dalí, além da trilha sonora composta pelo Pink Floyd e o conceito visual criado pelos artistas H. R. Giger, Dan O'Bannon e Möebius. Entretanto, os produtores declinaram da idéia, e o romance acabou sendo filmado nos Estados Unidos por David Lynch, que não concordando com os cortes que os produtores fizeram em sua obra, acaba por renegá-lo.

Após essa frustração, Jodorowsky produz Tusk (1980) que conta a improvável história de amizade entre uma menina e um elefante no seio de uma rica família inglesa na Índia Colonial. Nos anos 80 Jodorowsky passa a escrever histórias em quadrinhos em parceria com nomes consagrados das HQs, produzindo uma grande número de obras primas. A parceria com Möebius dá origem a Incal e A Casta dos Metabaroes. Com o iuguslavo Zoran Janjetov ele fez Os Tecnosacersotes e com Milo Manara, Bórgia.

Em 1989 retorna ao cinema com o filme Santa Sangre, bastante elogiado pela crítica e com uma boa bilheteria o que o faz ser convidado a filmar por um grande estúdio um roteiro do produtor
Alexander Salkind. Aceita o convite e filma O ladrão do arco-íris (1990). Entretanto, durante a produção, há diversos cortes contrários à vontade de Jodorowsky que ao final, Jodorowsky acaba por também renegar o filme.

Atualmente, Jodorowsky vive na França e passa seu tempo organizando encontros de leitura voluntários. Toda quarta-feira, reúne interessados e discípulos para ler trechos de obras na maioria das vezes espirituais. Há 14 anos, cumpre essa mesma rotina, segundo o próprio, sem cobrar nada, apenas juntando contribuições para quitar o aluguel da casa onde leciona. Atua como um líder espiritual, interpretando com gestos cada palavra e buscando investigar a alma humana.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

03/04: Amores Brutos (Alejandro G. Iñarritu, 2000)

Amores Brutos - Alejandro González-Iñarritu (2000)

Sinopse
Em plena Cidade do México, um terrível acidente automobilístico ocorre. A partir deste momento, três pessoas envolvidas no acidente se encontram e têm suas vidas mudadas para sempre. Um deles é o adolescente Octavio, que decidiu fugir com a mulher de seu irmão, Susana, usando seu cachorro Cofi como veículo para conseguir o dinheiro para a fuga. Ao mesmo tempo, Daniel resolve abandonar sua esposa e filhas para ir viver com Valeria, uma bela modelo por quem está apaixonado. Também se envolve no acidente Chivo, um ex-guerrilheiro comunista que agora atua como matador de aluguel, após passar vários anos preso. Ali, em meio ao caos, ele encontra Cofi e vê a possibilidade de sua redenção. Duração: 153 minutos.

Crítica: Amores Brutos (Alejandro G. Iñarritu, 2000)

por Z5
Extraído de
http://cineplectrum.blogspot.com/2010/01/amor-caoamores-perros-2000.html

Três histórias encontram-se numa colisão de automóvel num cruzamento da capital mexicana, num choque de acasos e destinos, e aqui desembarcam todas as conjecturas acerca desses mesmos acasos e destinos: é a realidade quem sempre pergunta, responde e exemplifica. Três personagens que apenas têm em comum os amores atribulados e a paixão pelos cães (que não passa de mero pano de fundo para enaltecer através dele os problemas sentimentais), envoltos num complexo argumento preocupado em ser o mais chocante possível na aspiração de nos mostrar, sem estereótipos, os campos sociais distintos balanceados entre as luzes da fama e da notoriedade e o submundo urbano. E mesmo diferentes no estatuto que lhes está rotulado, as personagens vivem, sofrem e choram os seus problemas de igual forma, como meros escravos das suas fatalidades.

Esta é a primeira parte de uma trilogia (que inclui “21 Gramas” e “Babel”) e que marca não só a estreia de Alejandro Iñàrritu nas longas-metragens como também o inicio da próspera colaboração entre Iñàrritu e Guilhermo Arriaga (e que iria terminar ainda durante a gravação de “Babel”), o responsável pelo brilhante roteiro que deu vida ao filme. Aqui começa também a constante referência de vários públicos ao estilo utilizado pelo director mexicano nos seus filmes, estilo esse característico de Quentin Tarantino: a narrativa fragmentada, não linear, e a utilização da violência como timbre das cenas fortes são marcas muito próprias do cinema de Tarantino, mas também não deixa de ser claro que estamos perante dois estilos bastante distintos na sua essência e nitidamente provenientes de escolas diferentes.

A violência presente não se remete a entreter ou a fascinar, os diálogos e as situações chocantes não são fragmentos perdidos ou supérfluos, são a resposta à pretensão do realizador em querer fazer um retrato social de uma capital violenta e multifacetada e apresentar nela personagens de elevada profundidade dramática e envoltas numa tensão quase sufocante. O elenco é soberbo, com especial destaque para Gael Garcia Bernal que adquire aqui o merecido reconhecimento internacional, a fotografia inquieta e a “câmara na mão” ajudam a criar um clima de gravidade que, juntamente com a montagem “um só objectivo”, não nos deixa ficar alheios ao sofrimento tão palpável e presente.

Drama realista, gritante, honesto e deveras perspicaz. Um ensaio de Humanidade que encontramos todos os dias na rua disfarçado de Casualidade.

PS: Vencedor de 11 prémios Ariel, Prémio da Crítica em Cannes e nomeado para o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro.


História do Cinema Mexicano

O Cinema chegou ao México apenas oito meses depois de sua primeira exibição em Paris pelas mãos de Claude Ferdinand Bon Bernard e Gabriel Veyre dois enviados franceses dos irmãos Lumière, os pais do cinema, para a divulgação do cinematógrafo na América Latina. Bernard e Veyre acabam permanecendo um período maior no México e acabam por realizar 35 filmes, considerados os primeiros da história do cinema mexicano, todos obras documentais sobre os políticos da época. Em 1896, Salvador Toscano Barragán abre a primeira sala de exibição e dois anos depois realiza o primeiro filme de ficção mexicano, Don Juan Tenorio (1896). O primeiro longa-metragem, no entanto, surgirá apenas em 1906, Fiestas presidenciales en Mérida (1906) de Enrique Rosas e primeira ficção longa metragem El grito de Dolores o La independencia de México (1907) de Felipe de Jesus Haro.

Com a Revolução Mexicana (1910), o cinema desse país dá um grande salto, realizando inúmeros registros documentais da revolução, sendo esta revolução o primeiro acontecimento histórico totalmente documentado pelo cinema. A chegada do som ao cinema mexicano nos anos 30 coincidiu com a visita do cineasta soviético Sergei Einsenstein que vem ao México gravar Que viva Mexico! (1931). Sua visita influenciou e estimulou o nascimento de um novo cinema mexicano, que, fortalecendo-se com o passar dos anos, forma uma verdadeira indústria cinematográfica nos anos 40 e 50, os chamados Anos de Ouro do Cinema Mexicano. Nesse período o cinema mexicano dominou a América Latina e imortalizou em toda a sua extensão atores como Pedro Infante, Dolores Del Río e o inesquecível Cantinflas, tendo como diretores principais nesse período Gabriel Figueroa e Emílio Fernández.

Em 1946 chega ao México o diretor espanhol Luis Buñuel que coloca definitivamente o México no mapa do cinema mundial. Fugindo da Guerra Civil Espanhola, Buñuel chega aos EUA em 1938 e depois de seguidos fracassos chega ao México em 1946, naturalizando-se. Luis Buñuel filma no México alguma de suas maiores obras primas Los Olvidados (1950); Él (1952), Nazarin (1958) e O Anjo Exterminador (1962). Suas obras eram carregadas de surrealismo já que era entusiasta desse movimento artístico, sendo inclusive amigo pessoal de Salvador Dali e juntos já haviam dividido a produção e a direção de O Cão Andaluz (1930) que à época mexeu com os alicerces do cinema mundial. Buñuel deixa o México após 1964, mas o surrealismo se mantém presente no cinema mexicano devido às obras do chileno radicado no México, Alejandro Jodorowsky. Jodorowsky migrou para o México em 1960, onde dirigiu peças de teatro, publicou histórias em quadrinhos e se iniciou como diretor de cinema em 1967 com Fando y Lis. Em 1971 lança El topo, um faroeste surrealista vanguardista. Com o apoio financeiro de Jonh Lennon, Jodorowsky lança em 1973 sua maior obra prima A Montanha Sagrada, tendo inclusive de ser obrigado a terminar as filmagens nos Estados Unidos já que vinha sendo ameaçado de morte pelo governo mexicano.

Durante os anos 80 o cinema mexicano passa por uma profunda crise, reerguendo-se apenas a partir dos anos 90 com os filmes Solo com tu pareja (Alfonso Cuáron, 1991), Cronos (Guilherme Del Toro, 1992) e Como água para chocolate (Alfonso Arau, 1992). Entretanto, é a partir dos anos 2000 que o México volta a surpreender o cinema mundial com obras que arrebatam diversos festivais internacionais. Diretores como Alejandro G. Iñarritu (Amores Brutos, 21 Gramas, Babel), Carlos Reygadas (Japón, Batalha no céu, Luz Silenciosa), Fernando Eimbecke (Temporada de Patos, Lake Tahoe) e Amant Escalante (Sangre, Los Bastardos) vêm atraindo a atenção do mundo para esse novo cinema mexicano e, apesar de possuírem estilos muito diferentes, unem o México culturalmente e levantam questões relevantes a toda a América Latina.