sexta-feira, 6 de julho de 2012

Crítica: Stalker (Andrey Tarkovsky, 1979)

por Rodrigo Fisher

Não são poucos os filmes que tentam explorar os vários aspectos da sociedade, e do ser. É ainda menor o número daqueles que tentam explicar o sentido da vida, seja de forma abstrata ou lógica. E são poucos os que conseguem tal façanha. Tomo a permissão de reduzir esse número a dezenas, se contarmos os que além de bons argumentos, forem verdadeiros deleites audiovisuais. Stalker, de Andrei Tarkovsky, é um dos poucos que conseguem flertar com a percepção do ser e estar. Com um pano de fundo ficcional, Stalker explora os campos metafísicos do ser, da esperança, da humanidade. Por metáforas e belos poemas, o longa constrói consigo uma responsabilidade grande, e com o decorrer da trama, somos brindados com a leveza do ser; com a capacidade humana de fé, ou falta dela.

Para se fazerem tais pregações, o longa usa como metáfora a Zona. O estranho e misterioso lugar, que tem a fama de ser a fonte da felicidade. Com isso, um professor e um escritor procuram um Stalker – homem capaz de levar à salvo pessoas à Zona -, para leva-los ao lugar e conseguirem o que buscam. Chegando lá, deparam com uma vegetação mórbida, e pelo caminho até o Quarto – lugar onde a felicidade estaria residida -, os homens enfrentam conflitos exteriores e interiores. 

Os personagens: professor e escritor representam, respectivamente, nossos lados esquerdos – responsável pela parte lógica – e direito – responsável pela parte emocional. Com esse embate de funções, os dois personagens estão em constantes conflitos. Em um desses conflitos, o sentido da vida é posto em discussão, e é proferida pelo Stalker a afirmação de que a música era um exemplo de sentido da vida. A música era a capacidade humana de exercitar o lado lógico e o lado emocional, e desse modo, tocar a alma do ser. Os recursos usados por Tarkovsky também são sublimes. A mudança de coloração, dos tons de cinza da cidade para a multicoloração da Zona é uma alusão à falta de esperança no centro urbano, e consequentemente, a abundância dela na natureza crua. 

Sobre a concepção da Zona, vale ressaltar a cena em que a câmera transpassa pelo solo do lugar, e com isso, nos é mostrado todos os valores da sociedade sobre as águas. Símbolos religiosos, dinheiro, armas, tudo o que o ser humano dá valor, na Zona, está destruído. Com isso, temos a idéia de que a Zona simboliza um lugar de inversão de valores. Certo ponto, um dos personagens cogita a possibilidade de se mudar para o lugar, assim não teria as preocupações dos centros urbanos, devido à calma ali encontrada. Além de tudo, a Zona é seletiva, deixando apenas entrarem os oprimidos, os infelizes, mas permitindo a estadia apenas aqueles que respeitarem as regras por ela impostas. 

Por fim, o filme trata da busca do ser humano por um lugar de paz, um lugar que dê a paz. E desacreditados, desistem dela por alegarem a falta de lógica. É a descrença humana posta em discussão. Não nos são oferecidas as respostas, mas a busca por elas, assim como a busca dos dois homens pela Zona.

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