quinta-feira, 19 de maio de 2011

Crítica: Loki - Arnaldo Batista (Paulo Henrique Fontanelle, 2009)

por Ana Martinelli
Extraído de http://cinema.cineclick.uol.com.br/criticas/ficha/filme/loki-arnaldo-baptista/id/2171


sinto o pulso de todos os tempos, comigo

até quando eu não sei

sinto o barato de ser ser humano, comigo

até quando, até quando Deus quiser.

O trecho acima faz parte da música Desculpe, do álbum Lóki?, de Arnaldo Baptista. O nome do primeiro álbum solo do eterno Mutante também dá nome ao documentário de Paulo Henrique Fontenelle, Loki – Arnaldo Baptista.

Produção do Canal Brasil, Loki – Arnaldo Baptista é muito fácil de assistir, por sua linguagem simples, direta, televisiva. O filme ganha com o tom despretensioso, Fontenelle deixa o espectador muito a vontade para se envolver com o personagem e sua trajetória de vida. Talvez a opção dê-se por conta da genialidade de seu objeto, podemos pensar em algo do tipo: ‘não temos a pretensão de ser tão genial quanto o gênio’. Mas pode ser também por falta de ousadia, pois o personagem permitia uma maior experimentação de linguagem.

Fontenelle acumula as funções de roteirista, diretor e montador. Logo, pressupõe-se que ele conhecia como ninguém o rico material que tinha em mãos e teve acesso privilegiado à Baptista, ex-Mutantes com exceção de Rita Lee, Tom Zé, Lobão, amigos e familiares. Cabia a ele a função de cortar os excessos e, certamente, o filme ganharia se fosse encurtado em pelo menos 20 minutos. O diretor faz um bom trabalho ao aproximar-se carinhosamente do mundo de Baptista, descortinar o que ele tem de mais precioso: seu senso de humanidade. Justamente por esta razão o filme merece ser visto, Arnaldo Baptista é absolutamente fascinante.

Arnaldo Baptista hoje dedica grande parte de seu tempo à pintura e Loki começa justamente com um quadro em branco. Com este recurso começamos o filme com um quadro a ser pintado, com as possibilidades de alçar vôo, a tela em branco é o convite à jornada e, cabe ao próprio Baptista a tarefa de pintá-la.

A ideia de construir com o espectador o quadro representando o caminho da narrativa da pintura pelo documentário é interessante e, apesar de não ser tão formal (leia-se muito "careta"), o filme é didático. Segue uma linha cronológica, aproveita-se de “ganchos” das falas dos entrevistados ou de frases musicais para introduzir e encadear a narrativa por temas. Flerta com a busca de imagens e sons mais poéticos ao sobrepor passado e presente.

Sem dúvida, é delicioso conhecer mais e, para alguns, até reviver os tempos dos Mutantes. Compartilhar a inocência e as rupturas do jovem grupo que revolucionou a música brasileira fazendo o bom e "novo" rock´n´roll. Mas Loki é sobre Arnaldo Baptista, o homem, que é também músico, compositor, que mantém uma pureza no olhar de causar inveja às crianças mais inocentes, mas que sofreu por viver para e pela música e nesta trajetória há passagens obscuras, drogas, depressão e mesmo uma tentativa de suicídio. Confortador, o documentário trata tudo com leveza, reverência, sem contestação.

Nos últimos tempos, o documentário brasileiro tem se dedicado a resgatar a memória musical do país, entre eles Um Homem de Moral, sobre Paulo Vanzolini, Simonal - Ninguém Sabe o Duro que Deu e Cantoras do Rádio. Em breve teremos Raul Seixas: O Início, o Fim e o Meio. Loki – Arnaldo Baptista vem contribuir neste sentido, mas o seu maior trunfo não é a música em si. Arnaldo Baptista é um gênio, entrar em sua sintonia é um deleite!

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