por Rodrigo Fisher
Não são poucos os filmes que tentam explorar os
vários aspectos da sociedade, e do ser. É ainda menor o número daqueles
que tentam explicar o sentido da vida, seja de forma abstrata ou lógica.
E são poucos os que conseguem tal façanha. Tomo a permissão de reduzir
esse número a dezenas, se contarmos os que além de bons argumentos,
forem verdadeiros deleites audiovisuais. Stalker, de Andrei Tarkovsky,
é um dos poucos que conseguem flertar com a percepção do ser e estar.
Com um pano de fundo ficcional, Stalker explora os campos metafísicos do
ser, da esperança, da humanidade. Por metáforas e belos poemas, o longa
constrói consigo uma responsabilidade grande, e com o decorrer da
trama, somos brindados com a leveza do ser; com a capacidade humana de
fé, ou falta dela.
Para se fazerem tais pregações, o longa usa como metáfora a Zona. O estranho e misterioso lugar, que tem a fama de ser a fonte da felicidade. Com isso, um professor e um escritor procuram um Stalker – homem capaz de levar à salvo pessoas à Zona
-, para leva-los ao lugar e conseguirem o que buscam. Chegando lá,
deparam com uma vegetação mórbida, e pelo caminho até o Quarto – lugar
onde a felicidade estaria residida -, os homens enfrentam conflitos
exteriores e interiores.
Os personagens: professor e escritor representam,
respectivamente, nossos lados esquerdos – responsável pela parte lógica –
e direito – responsável pela parte emocional. Com esse embate de
funções, os dois personagens estão em constantes conflitos. Em um desses
conflitos, o sentido da vida é posto em discussão, e é proferida pelo
Stalker a afirmação de que a música era um exemplo de sentido da vida. A
música era a capacidade humana de exercitar o lado lógico e o lado
emocional, e desse modo, tocar a alma do ser. Os recursos usados por
Tarkovsky também são sublimes. A mudança de coloração, dos tons de cinza
da cidade para a multicoloração da Zona é uma alusão à falta de
esperança no centro urbano, e consequentemente, a abundância dela na
natureza crua.
Sobre a concepção da Zona, vale ressaltar a cena em
que a câmera transpassa pelo solo do lugar, e com isso, nos é mostrado
todos os valores da sociedade sobre as águas. Símbolos religiosos,
dinheiro, armas, tudo o que o ser humano dá valor, na Zona, está
destruído. Com isso, temos a idéia de que a Zona simboliza um lugar de
inversão de valores. Certo ponto, um dos personagens cogita a
possibilidade de se mudar para o lugar, assim não teria as preocupações
dos centros urbanos, devido à calma ali encontrada. Além de tudo, a Zona
é seletiva, deixando apenas entrarem os oprimidos, os infelizes, mas
permitindo a estadia apenas aqueles que respeitarem as regras por ela
impostas.
Por fim, o filme trata da busca do ser humano por um
lugar de paz, um lugar que dê a paz. E desacreditados, desistem dela por
alegarem a falta de lógica. É a descrença humana posta em discussão.
Não nos são oferecidas as respostas, mas a busca por elas, assim como a
busca dos dois homens pela Zona.
Nenhum comentário:
Postar um comentário