sexta-feira, 11 de junho de 2010

Crítica: Lanternas Vermelhas (Yimou Zhang, 1991)

Extraído de http://miriamfajardo.blogspot.com/2008/06/lanternas-vermelhas-1991.html

No início do século XX a China ainda preservava algumas tradições milenares. Uma delas dava total liberdade ao homem rico, de possuir o número de esposas que ele bem desejasse. Quando utilizei o verbo possuir é porque estas mulheres eram compradas, e esses homens poderosos pagavam um dote por elas. A partir daí, a situação dessas mulheres seria a de propriedade. O filme concentra toda a sua tensão entre os muros da propriedade de um poderoso homem e a rivalidade de suas quatro esposas. A tradição é assim: o mestre seleciona uma de suas esposas para passar a noite. A eleita recebe um tratamento especial, com direito a massagem nos pés e a escolha do cardápio para as refeições do dia seguinte, e a fachada de sua casa é iluminada com enormes lanternas vermelhas. São raros instantes de prazer dos quais ela pode gozar antes de mais uma vez disputar a atenção do mestre com as “irmãs”. A chegada de Songlian gera ciúmes e descontentamento uma vez que ela rapidamente passa a se tornar a favorita do mestre.

Dividido em quatro partes — as estações do ano —, Lanternas Vermelhas apresenta as quatro mulheres, de quatro gerações diferentes, não tanto como esposas, mas sim como concubinas, destinadas a servir o marido num ciclo perpétuo de obediência e humilhação. As estações talvez simbolizem cada uma das quatro personagens: a primeira esposa, fria e pouco solicitada, seria o inverno. A segunda esposa, no outono da vida, luta silenciosamente contra o perecimento de sua fertilidade. A terceira esposa, bela como a primavera, é um poço de exuberância e classe. Songlian, representando o verão, é quente, incipiente, fresca.

Os enquadramentos de Zhang Yimou, na maioria, são frios, distantes e simplistas. E por vezes, espetaculares. A fotografia do filme desenha um impecável contraste entre o brilho rubro que emana da casa eleita pelo mestre para passar a noite e a escuridão em que as outras três concubinas fazem seus planos de sedução. Lanternas Vermelhas expõe os sentimentos de vingança, traição e descontentamento em que as mulheres eram diariamente submetidas, o que é percebido com clareza em determinadas cenas como a do corte de cabelo. É notável a idéia do diretor em jamais mostrar o rosto do mestre ao longo do filme. Sempre o vemos de costas, ou de longe, ou por trás dos véus que circundam a cama de suas esposas, reforçando a idéia de que ele poderia ser qualquer um, qualquer pessoa daquela época. A ênfase está exatamente nas atrizes, apontando a condição feminina daquele país. As mulheres não tinham voz ativa em qualquer contexto, eram reduzidas unicamente a objetos sexuais, e poderiam sofrer graves conseqüências caso “saíssem da linha”. Lanternas Vermelhas, portanto, trata-se de uma denúncia não apenas ao horror da poligamia consentida, mas à luta pela sobrevivência das mulheres em meio ao machismo oriental.

Nenhum comentário: