sexta-feira, 11 de maio de 2012

Crítica: Casanova e a Revolução (Ettore Scola, 1982)



“Casanova e a Revolução”, do diretor italiano Ettore Scola, faz uma leitura muito particular da Revolução Francesa. O filme, como indica o título original, La nuit de Varennes, se passa durante a famosa tentativa de Luís XVI em fugir da Paris revolucionária, em 1791. Como se sabe, a fuga não foi bem sucedida, o rei foi preso e reconduzido a Paris. O fato ajudou a radicalizar a revolução e acabou resultando no julgamento e assassinato do rei. O filme não retrata exatamente a tentativa de fuga e captura do monarca francês, mas acompanha uma comitiva que seguia seus passos. Nela, seguiam Restif de la Bretonne, um famoso publicista do período, hoje mais conhecido pelo seus livros eróticos (o mais famoso é o Anti-Justine, uma resposta polêmica ao texto do Marquês de Sade), Thomas Paine, uma dama de honra de Maria Antonieta junto com seus consortes e companheiros. No meio do caminho, juntou-se o velho Giacomo Casanova. Por isso, a narrativa está muito mais centrada nos dramas desses indivíduos do que na reconstrução dos eventos políticos que corriam pela França. No filme de Scola, a Revolução serve como uma grande metáfora da velhice. O Casanova do filme, interpretado magnificamente pelo mais genial dos atores italianos, Marcello Mastroianni, é uma pálida figura do que fora no passado (é bem interessante compará-lo com o Casanova de Fellini). O grande sedutor das cortes européias se tornou um homem envelhecido, incapaz de exercer sua arte erótica, vivendo uma existência meio melancólica, uma indiferença com o mundo, quase desligado das paixões mundanas. Seu corpo carcomido pelo tempo, cheio de dores, marcas, rugas, pequenas degradações marca uma substituição da sua antiga dignidade. Tudo que lhe resta é um sábio distanciamento do mundo. Casanova é o símbolo do Antigo Regime que está rapidamente acabando, de um mundo antigo revolucionado por novos hábitos e novos personagens. O grande drama do filme subsiste nisso, na tensão entre um mundo antigo e a juventude do novo. Ettore Scola fala muito mais dessa condição melancólica do homem do que da própria Revolução Francesa. Só que a velhice de Scola, ainda que melancólica, não é trágica. Casanova também representa aquela sabedoria da experiência, tão misteriosa para o nosso mundo, daquele que sabe que a renovação da juventude é a renovação do mundo, e tudo que resta é um sereno sair de cena. Não é gratuito que o título italiano do filme seja Il mondo nuovo. É dessa transação entre o velho e o novo, entre o estável e o revolucionário, que trata o belo filme de Ettore Scola.

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