sexta-feira, 28 de maio de 2010

A Questão Palestina

A Questão Palestina

O texto abaixo foi extraído do livro Oriente Médio e a Questão Palestina. Nelson Bacic Olic e Beatriz Canepa. Editora Moderna. 203. p 82-86

A chamada Questão Palestina tem se constituído no mais persistente foco de tensão no Oriente Médio. De forma bastante sintética, ela refere-se à luta de dois povos, o judeu e o árabe-palestino, pela posse de uma área, a Palestina, sobre a qual ambos julgam ter direitos históricos ou adquiridos. Por estar localizada numa espécie de encruzilhada entre as civilizações árabe-islâmica e ocidental, a região passou por vários domínios. Um dos mais longos foi aquele exercido pelos turcos-otomanos, que durou de 1.516 até o final da Primeira Guerra Mundial. Durante este conflito, os britânicos encorajaram a rebelião árabe contra os otomanos e, vencendo-os, ocuparam a Palestina. Pelos acordos firmados no final do conflito, a Sociedade das Nações, uma espécie antecessora da ONU, confiou os destinos da Palestina à Grã-Bretanha. Os britânicos mantiveram o controle da região até 1.947, quando, incapazes de evitar os confrontos entre a majoritária população árabe e a crescente comunidade judaica, passaram o problema para a ONU. Esta propôs um plano de partilha da Palestina em dois Estados, um judeu e um árabe. Essa proposta, aprovada pela Assembléia Geral da organização, foi rejeitada pelos árabes da Palestina e países árabes vizinhos. O conflito que se seguiu entre árabes e o recém-criado Estado judeu (Israel) teve os últimos como vitoriosos. Se, de um lado, Israel concretizou o sonho acalentado pelos judeus, que desde o início da era cristã almejavam um lar nacional, de outro, marcou o início de um drama de um outro povo, os árabes da Palestina. Desde então, eles, que passaram a ser conhecidos simplesmente por palestinos, vêm lutando pela criação de um Estado nacional.

Ai de ti, Jerusálem

O texto abaixo foi extraído do boletim Mundo - Geografia e Política Internacional (ano 2, n. 3, maio de 1994, p. 7) e discute a importância simbólica da posse de Jerusalém entre judeus e palestinos.

Nenhuma questão é tão espinhosa na geopolítica do Oriente Médio quanto a do status de Jerusalém. Reivindicada como sua capital por israelenses e palestinos; declarada cidade internacional pelas Nações Unidas (em 1.948); sede das três mais importantes religiões monoteístas (judaísmo, catolicismo e islamismo); local bíblico de passagem de profetas e vilões; pecadores e santos, messias e déspotas; território disputado por impérios, por cruzados e por mercadores, Jerusalém, mais do que qualquer outra cidade no mundo, é um símbolo — que transcende em muito, nessa qualidade, a sua eventual importância estratégico-militar. Quando se discute a posse de Jerusalém, o que se coloca em jogo é a posse de uma chave quase mágica, que conferirá ao seu eventual senhor a legitimidade de pelo menos 3 mil anos de história. O ano que vem em Jerusalém: na senha da Diáspora judaica, Jerusalém tornou-se o lugar mitológico de um povo milenarmente destituído de seu lugar geopolítico. Um mito de tamanho poder, uma virtualidade sustentada por uma força tão material que pôde fundamentar, culturalmente, uma coesão que desafiou o tempo, a hostilidade dos impérios e — suprema ignomínia — o holocausto de Adolf Hitler.

Sanaúd (Voltaremos): na senha palestina, nessa Diáspora contemporânea, a saudação tem o duplo valor de uma advertência e de uma aspiração. Jerusalém não é, agora, um local apenas preservado pela memória. Não. Ali estão, ainda, as casas das quais palestinos ainda vivos foram expulsos pelos novos ocupantes judeus, as ruas e as construções que ainda ecoam suas vozes, mesquitas em que jamais foram interrompidas suas orações. Voltar a Jerusalém é sanar uma injustiça, costurar o que foi rompido, lavar com água fresca a amargura da despossessão. Mas tampouco Jerusalém é o condomínio de judeus e palestinos. É um patrimônio da humanidade naquilo que ela tem de mais perene, a identificação religiosa materializada em símbolos e locais “sagrados”. Ali estão o Muro das Lamentações, as sinagogas ancestrais, os túmulos de Davi e Absalom, a Basílica do Santo Sepulcro, o Santuário da Ascensão de Cristo, o caminho do Calvário, as mesquitas muçulmanas, a tumba de Lázaro. É dessa identificação — a mesma que, nos limites tantas vezes construídos pela História, gera a intolerância cultural, o ódio étnico e exclusivista — que a “Cidade Santa” extrai sua força, seu magnetismo, seu enigma. Nesse sentido, Jerusalém também é o grande testemunho de que os homens hoje não são tão radicalmente distintos daqueles que vagavam pelos desertos do Oriente Médio antes de Cristo. Subsiste o dilema. A que Estado pertence Jerusalém? Não haverá qualquer acordo realista entre judeus e palestinos sem a resolução desta questão. Na pior hipótese, não haverá mesmo acordo nenhum. Mais uma vez, o fantasma evocado pela profecia bíblica – “Ai de ti, Jerusalém, não restará pedra sobre pedra” – pesa sobre o destino dos que tentam viver.

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